Por Bruno Soller
Uma interessante pesquisa feita pela Universidade de Wisconsin, dos Estados Unidos, mostra que 64% dos humanos tendem a procurar conforto quando se deparam com uma situação de insegurança e medo. Algumas síndromes da era moderna, mostram que muitos reagem até mesmo com paralisia ao se sentirem expostos a situações de risco. Fato é que ao serem tiradas da zona de conforto e colocadas à prova, as pessoas tendem a buscar o conhecido, conservando possibilidades já experimentadas.
A crise gerada pelo novo coronavírus é um desses fatores externos que trazem consigo pavor. Em pesquisa realizada pelo Instituto Travessia para o Valor Econômico, 64% dos entrevistados acreditam que os efeitos econômicos serão devastadores. Outros levantamentos feitos em alguns municípios da grande São Paulo, mostram que 82% das pessoas dizem sentir algum tipo de medo em relação à pandemia, sendo que o de perder alguém próximo para a doença representa quase 50% desse sentimento.
Transportando esses fatos para analisar o processo eleitoral municipal deste ano, talvez seja o momento mais propício para mandatários que estão no poder conseguirem sua manutenção ou a de seu grupo político. Em período anterior à crise, em fevereiro, apenas 22% dos eleitores brasileiros diziam que gostariam de votar em um prefeito que estivesse no cargo ou em alguém indicado por ele, como mostrou uma coleta realizada com exclusividade pelo Instituto Travessia ao Valor Econômico. No entanto, o desdobramento da crise pode representar uma grande mudança dessa percepção.
O exemplo mais emblemático dessa relação medo e conservação do voto é a guinada dada por George W. Bush, após os ataques das torres gêmeas em setembro de 2001. Bush que fazia um governo mal avaliado, conseguiu garantir a reeleição, após sua condução frente ao combate ao terrorismo, com a intervenção militar por ele defendida, no Iraque, em uma campanha marcada pelo discurso da importância de se ter um líder forte em tempos de guerra.
Esse fenômeno, todavia, não é recente. No próprio Estados Unidos, Franklin Delano Roosevelt foi a maior prova dessa dualidade que se retroalimenta. Eleito, pela primeira vez, em 1932, Roosevelt enfrentou de cara a maior recessão econômica da história americana, com o crack da bolsa de 29. Com o seu ousado plano, o “New Deal” foi recuperando aos poucos o país e se perpetuando no poder através de eleições diretas. Foram 3 reeleições e 4 mandatos. Nesse período, enfrentou a segunda guerra mundial e foi se conservando no poder até sua morte. Mesmo assim, sua popularidade e o medo da mudança em tempos difíceis, garantiram ao também democrata Harry Truman, a sua sucessão.
Em 2005, na cidade de New Orleans, outro fenômeno externo aterrorizou a população. O furacão Katrina dizimou a maior do estado da Lousiana, causando milhares de mortes e deixando diversas famílias sem moradia, desabrigadas, vivendo em ginásios poliesportivos. No início de 2006 eleição para prefeito, e vitória do ocupante do cargo, Ray Nagin. Mesma tônica ocorreu, em 2016, na cidade de Mariana, que reelegeu o prefeito Duarte Junior, após o trágico estouro da barragem, no ano anterior.
A gestão da crise do coronavírus tem feito a maioria dos presidentes e primeiros ministros dos mais variados países do mundo crescerem na aprovação popular de maneira significativa. Conte, na Itália, aumentou incríveis 27 pontos de sua avaliação, em um mês. Angela Merkel, na Alemanha 11% , e Rutte, na Holanda, e Macron, na França, 7. Esse fenômeno também ocorreu na Argentina com Fernández e na Índia, com Modi.
Voltando ao presidente mais longevo da história americana, Roosevelt ensinou, dizem que inspirado em provérbio africano, que em época de crise é necessário “falar com suavidade e ter na mão um grande porrete”, ou seja, ter a compaixão e emoção necessárias para lidar com o sofrimento das pessoas, mas ter pulso e agir para resolver os problemas doa a quem doer. Ser assertivo, mas sem perder a sensibilidade, parafraseando o psicanalista britânico Wilfred Bion, “uma verdade dita sem amor, é crueldade.”
Diante de todo esse quadro, os atuais mandatários têm nas mãos uma nova oportunidade de se entenderem com o eleitor. A crise gerada do coronavírus pode ajudar a zerar uma relação que estava abalada. Cuidar de quem mais precisa é o lema que deve nortear boa parte das campanhas desse ano. Em tempos não tão distantes, as cidades estavam discutindo mobilidade, novas tecnologias e formas de gestão. Parecia que os problemas sociais estavam razoavelmente controlados. A nova realidade, impõe um novo olhar.
O coronavírus tem exposto um país pouquíssimo preparado para enfrentar adversidades. O sistema de saúde colapsado mesmo com poucos casos em algumas cidades do interior brasileiro. Outras capitais, como Manaus, com uma população na faixa de 2 milhões de habitantes, sem capacidade até para enterrar as vítimas fatais. Um verdadeiro caos social, que será evidenciado durante toda a discussão eleitoral. Não há dúvida de que a crise será o tema central da disputa.
Além da crise dos serviços públicos, há uma previsão geral de empobrecimento em todo o mundo. O Brasil deve experimentar uma retração do PIB de quase 5%. A recuperação lenta e gradual que vinha desde o terceiro trimestre de 2017 será zerada. Quem quiser dialogar com os eleitores nessa próxima eleição terá que entender essa nova realidade, esse Brasil da pandemia, compreender que o desigual Brasil caminha para o aumento ainda maior de famílias nas classes C2 e D.
Os prefeitos fracos, que não conseguirem acalentar e dar norte aos seus habitantes serão substituídos, muito provavelmente pelos candidatos que imprimirem um tom social na sua conexão e que despertarem confiança para que o eleitor, mesmo em período de medo, possa fazer uma transição para alguém que o conforte. Para sentar na cadeira de prefeito, o candidato deverá se mostrar e agir como um verdadeiro líder.
(*) Bruno Soller é estrategista político e especialista em pesquisas de opinião. Escreve às terças-feiras no portal Eleições Brasil.
Twitter: @brunosoller – Instagram: @brunosoller – E-mail: brunosoller@gmail.com
Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do portal Eleições Brasil, sendo de inteira responsabilidade de seus autores.