Em sua mais recente coluna semanal ‘Porandubas Políticas”, o professor Gaudêncio Torquato (*) analisa a liderança politica no Brasil, elencando alguns valores que, ao seu ver, faltam aos políticos brasileiros e avaliando o perfil de alguns líderes nacionais.
Confira a seguir:
Mapa em branco
Em matéria de liderança, o Brasil é um mapa em branco. O país caminha às escuras por faltar um líder confiável, competente, capaz de comandar um Projeto de Nação. A questão brasileira esbarra na falta de lideranças. Os quadros que temos à vista não preenchem a planilha dos valores que ilustram a grandeza de um perfil, entre os quais destaco quatro:
- Sapiência – Mais que domínio do conhecimento, sapiência é sabedoria, a habilidade no manejo da política, a capacidade de entender o mundo, de liderar um grande programa de reformas, de elevar a confiança social.
2. Dignidade – Vida decente, história de bons feitos, passado limpo, reconhecimento do traçado reto que marca a trajetória do protagonista.
3. Elevação espiritual – Pode parecer um valor religioso, mas no sentido que se coloca aqui é a capacidade do político de mostrar desprendimento das coisas materiais, despojamento, simplicidade, disciplina, diálogo.
4. Autoridade – Não significa autoritarismo, a vontade de reprimir, lutar, guerrear, mas a capacidade de ser ouvido com respeito, sua voz ser seguida e suas ordens cumpridas, sem uso da força.
Perfis do momento
Fernando Henrique – O tucano-mor expressa uma visão abrangente, tem prestígio junto ao empresariado, mídia, intelligentsia. Sempre ouvido e procurado pelos tucanos. Mas sem poder de mobilização. Não une partidos.
Lula – Cada vez mais se isola. Entende o Brasil como território perdido pelo PT, mas possível de ser resgatado. Sem sintonia com a realidade. Não quer ceder espaço a outros. O ciclo Lula passou. Difícil ganhar papel de comando de uma Frente Ampla.
João Doria – Governador de São Paulo, Estado mais forte do país – 46 milhões de votos – potencial candidato à presidência da República em 2022, Doria pode se tornar uma opção do centro-direita. Mas se avoluma teor crítico contra ele. Considerado extremamente ambicioso e sem querer repartir poder. Imagem muito ligada à nata do empresariado mais jovem. Não tem forte adesão popular.
Fernando Haddad – O quadro mais preparado do PT. Mas uma ilha. Carece de apoio intenso no próprio partido, mas sobre sua imagem derrama-se parcela da imagem do PT, sempre lembrado por falcatruas.
Wilson Witzel – Era uma esperança no início do governo, envolve-se em uma teia de acusações. Um ex-juiz que não carrega a boa imagem da magistratura. Acusado de prestigiar velhos esquemas.
Ciro Gomes – Polêmico, linguagem desabrida, muito questionado por lideranças políticas. Bem informado, boa bagagem acadêmica, respeitado por economistas, sempre atento à pauta nacional. Mas é alvo de intenso tiroteio. Velha carta do baralho.
Jair Bolsonaro – O mandatário-mor é uma fonte inesgotável de crises. Visão radical, armamentista, forte influência dos filhos (filhocracia), cercado de generais, passa a imagem de ser um transtorno à política e um risco à governabilidade. Interesse em manter a polarização com o PT. Mostra-se despreparado. E responsável pela imagem negativa do Brasil na paisagem internacional.
Marina Silva – Perfil que denota fragilidade. Imagem positiva na esfera ambientalista. Não tem capacidade aglutinativa. Era Marina passou.
Luciano Huck – Empresário e apresentador de programa popular na maior TV do país, um perfil apolítico, mas sem densidade no espaço do conhecimento da realidade nacional. Imagem de que pode ser o testa de ferro de poderoso grupo de mídia. Passível de questionamentos.
Rodrigo Maia – Com uma boa folha de serviços prestados ao país, no comando da Câmara Federal, carece de apoio popular. Tem uma agenda cheia e pode ser um eficiente quadro na articulação para 2022.
Flávio Dino – Imagem que se projeta além da fronteira do Maranhão, o governador pode ser componente de uma chapa majoritária Federal, mas é pequeno para encabeçar o posto principal de candidato a presidente. Boa fluência. Mas, sob o aspecto partidário, restrito.
Rui Costa e Camilo Santana – Os governadores petistas da Bahia e do Ceará seriam naturais lideranças arejadas para ocupar espaço no PT, mas Lula não dá condições. Faltam a ambos visibilidade mais ampla no país. E sua performance dependerá dos resultados a serem alcançados pelo combate à epidemia em seus Estados.
Paulo Câmara – Limitado a Pernambuco, o governador do PSB é um quadro ainda pouco conhecido, podendo vir a ser estrela do partido mais adiante. Ao PSB falta densidade nacional.
ACM Neto – O prefeito de Salvador e presidente do DEM, ACM Neto, pode entrar bem na articulação política de 2022, e tem apoio popular na Bahia. Também não representa novidade na política.
Davi Alcolumbre – Ganhou imagem no comando do Senado, mas com pequena possibilidade de ter dimensão nacional.
Guilherme Boulos – Perfil contundente do MTST, restrito a pequeno espaço numa das extremidades do arco ideológico.
Eduardo Leite – O governador do RS, do PSDB, tem perfil jovial, mas limita-se à região Sul.
Romeu Zema – Esperava-se mais do governador mineiro, mas o Novo, seu partido, não tem sobressaído na esfera política e governativa.
Paulo Hartung – O ex-governador do Espírito Santo é um nome de respeito, agindo hoje como conselheiro político. Parece desinteressado em perfilar na linha de frente.
Sergio Moro – Sem o palanque da visibilidade como ministro, pode perder espaço e ser canibalizado por outros nomes. Perfil apolítico, tem condições de ser atraído por algum partido e entrar na arena de 2022. Dependerá da situação do país.
(*) Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP, consultor político e de comunicação.
Twitter: @gaudtorquato – Site: www.gtmarketing.com.br
Fonte: Coluna Porandubas Políticas nº 669, de 10 de junho de 2020, confira a íntegra clicando aqui.