Juro, eis minha ‘verdade’

Por Gaudêncio Torquato*

O momento em que vive o país é farto na produção e proliferação de versões estapafúrdias e meias-verdades.

A CPMI, que apura os desastrados eventos de 8 de janeiro, mais parece um desfile dos três macaquinhos: não vi, não ouvi, não falei. As joias das Arábias povoam a lenda sobre malandragem. O advogado de Bolsonaro diz que não participou de coisa alguma na operação de compra e venda das ditas cujas, desdizendo-se pouco depois, ao assumir a recompra do caro relógio suíço Rolex pela bagatela de US$ 49 mil, já com desconto. Um hacker diz que recebeu dinheiro de uma parlamentar para invadir o site da Alta Corte e fustigar um ministro. A deputada nega, mas ele confirma.

Historinhas e mentiras surgem de todos os lados. Cada qual com seu viés.

Pois bem, ante essa paisagem de disse-me-disse-não é assim-não é assado, este escriba decide contar o que enxerga e lê. E sugere que cada leitor tire suas conclusões sobre o índice de verdade do relato que se segue.

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O país vive um momento de culto à ética e respeito aos valores morais que dignificam o Homem. Vivemos tempos de rigoroso cumprimento de leis.

O caráter do povo é reto e imaculado, fruto de uma herança cultural alicerçada no civismo, na solidariedade, no culto às tradições, na religiosidade, no respeito aos mais velhos, no carinho e proteção às crianças e na repartição justa dos bens produzidos. Aqui, atingir a honra de um cidadão equivale a ferir a alma da Pátria. Preserva-se e adota-se o abençoado lema “todos por um e um por todos”.

Os nossos políticos são exemplos de civilidade, magnanimidade, correção e desinteresse pessoal. Graças a eles, o sistema federativo vive em harmonia e equilíbrio. Os recursos se distribuem igualitariamente, provendo necessidades fundamentais da população, dentro de um rigoroso plano de prioridades. Os potenciais das regiões se completam e a racionalidade administrativa gera bolsões de aplaudidas gestões de governantes. O excedente da produção nacional é exportado e acarreta centenas bilhões de divisas que, da mesma forma, são distribuídas equitativamente pelas regiões exportadoras.

O Congresso brasileiro vota apenas leis fundamentais. Não há centrão, centro ou centrinho que tente lutar por interesses de siglas e blocos. Desenvolvem-se acuradas práticas políticas para evitar coisas descabidas e indesejadas pelas populações. Quase não se fazem emendas a projetos de lei, do Legislativo ou do Executivo, porque eles são tão benfeitos, que dispensam reparos. Não se perde tempo com discussões obtusas.

O dinheiro é gasto com parcimônia e cada tostão é comprovado. Todos os dias, na Praça dos Três Poderes, em Brasília, atualiza-se o placar do Orçamento da República, onde as pessoas podem verificar quanto se gastou e com quem. A transparência é total. Os cartões corporativos, de uso do Executivo, são preservados. Não há gastança como no passado.

Nas CPIs, como as que estamos acompanhando (CPMI, MST), tudo é muito rápido e objetivo. Irregularidade constatada, infrator na cadeia, depois de observados os devidos preceitos legais. Os parlamentares são comedidos e, graças à modéstia de seu caráter, procuram não expor em demasia seus nomes. Os fatos estão sempre acima das pessoas. Afinal de contas, não se cultiva no Brasil aquele sentimento exibicionista e sensacionalista de países do Hemisfério Norte. As campanhas políticas constituem modelos de rigor ético. Não se pode gastar acima de um teto previamente estabelecido. Não há Caixa 2. Os candidatos, mesmo os ricos, em suas campanhas, se impõem um compromisso de não abusar do poder da grana. Sabem que o mandato é missão e não balcão de negócios.

Empreiteiras, bancos, grupos e conglomerados não financiam pleitos, como em certos países bárbaros. Seus lucros são frequentemente repartidos em obras sociais. Por isso, o povo brasileiro exibe um dos maiores índices de qualidade de vida do mundo. O nosso povo é o mais feliz do mundo, ainda mais que o Butão, na Ásia, onde os costumes estão diretamente conectados à felicidade.

Nosso povo é educado, tem boa segurança, é bem alimentado e sadio. Os partidos fazem exatamente o que dizem. Quando seus candidatos chegam ao poder, executam fielmente os programas partidários. No Brasil não existe a pilhagem de “utilizar a máquina” em benefício partidário. O toma-lá-dá-cá foi abolido da vida pública.

As siglas se alimentam, todo o tempo, do pão cívico, sendo este o mais consumido alimento da pátria.

Não há devastação de florestas e ameaças ao bioma amazônico. Não há uma nesga de fumaça nos céus do norte do país. O planeta aplaude o Brasil por cumprir, há tempos, a meta de desmatamento zero, promessa do mandatário-mor para 1930. Antecipamos.

Figurantes de todos os Poderes são simples, modestos e não carregam sacos de vaidades sobre os ombros. O pensamento é uniforme. “Vamos elevar o Brasil ao pódio da grandeza”. Nenhum deles luta para ser “o melhor”, “o mais trabalhador”. Nosso Poder Judiciário é ágil e completamente à prova de corrupção. Nunca um homem da justiça foi pego com a boca na botija. Ou decidindo sob a espada da política.

Os meios de comunicação só expressam a verdade. Não dão vazão a mexericos e fatos secundários. A decência é praticada com muito respeito aos contrários. Não se ouve palavrão em foros e redes sociais. A cordialidade é plena. Não existe desamor.

A mãe pátria é o símbolo da virtude e não uma exclamação depravada na boca de ímpios que trocam impropérios.

Essa é a minha verdade.

*Gaudêncio Torquato é jornalista, professor (USP) e consultor político.