A reta final de uma campanha e a persistência como método

“É madrugada, parece estar tudo normal
Mas esse homem desperta, pressentindo o mal
Muito cachorro latindo, au, au ele acorda ouvindo
Barulho de carro e passos no quintal

A vizinhança está calada e insegura
Premeditando o final que já conhecem bem
Na madrugada da favela não existem leis
Talvez a lei do silêncio, a lei do cão talvez”

Os versos de “Homem na Estrada”, dos Racionais MCs, surgem bem no início de “Quatro dias com Eduardo”, documentário em que o cineasta Victor Hugo Fiuza mostra a reta final da campanha do ex-senador Eduardo Suplicy para a Câmara Municipal de São Paulo, em 2016. Com 1h16min de duração, o filme foi exibido no Youtube neste sábado (23/05) e encontra-se disponível aqui e aqui.

Situado entre a sexta-feira (30/09) e o a segunda-feira (03/10) – dia seguinte ao primeiro turno da eleição de 2016 –, o filme se passa em quatro dias da rotina de um político icônico do Partido dos Trabalhadores (PT), com mais de quatro décadas de carreira (seu primeiro mandato, de deputado estadual, se iniciou em 1979) e que se aproxima dos 80 anos (completará 79 neste ano).

“Quatro dias com Eduardo” dialoga com um projeto semelhante – o documentário “Vocação do Poder”, cujo foco era a campanha de seis candidatos a vereador pelo Rio de Janeiro em 2004. No entanto, o documentário sobre Suplicy tem abordagem mais direcionada, tanto na delimitação temporal quanto na escolha que faz de um protagonista específico.

Ao optar por intercalar cenas de campanha e momentos íntimos, o olhar do diretor Victor Hugo Fiuza e de sua equipe técnica identifica um homem cuja persistência se destaca entre as características que o definem. Persistência, diga-se de passagem, necessária para a campanha de 2016, a primeira eleição realizada após o Impeachment da presidenta Dilma Rousseff, correligionária de Suplicy. Seja ao dialogar com eleitores contrários ao PT, seja muitas vezes buscando convencer os próprios assessores sobre seus pontos de vista, impressiona a determinação do então candidato a vereador, sobretudo por conseguir agir desta forma sem se exaltar.

Lidando com adversidades na campanha

Para quem pretende se candidatar ou aos interessados em trabalhar nas próximas eleições, o documentário é ainda pedagógico no sentido de como se lidar com situações adversas. A qualquer momento, surgem situações inesperadas em que a rejeição ao PT obriga Supilcy e sua equipe de campanha a se reposicionarem. Como o filme deixa bem claro que o candidato a vereador estava bastante engajado na campanha do então prefeito e concorrente à reeleição Fernando Haddad, a rejeição do candidato majoritário também o atinge nos momentos finais da campanha registrados no documentário.

A capacidade de lidar com situações simultâneas – e antagônicas – surge no pós-eleição, quando o ex-senador e sua equipe acompanham os números da apuração, em sua residência. À medida que se consolida sua vitória como vereador mais votado do país, Suplicy não esconde a frustração com a derrota de Haddad se delineando, já no primeiro turno, para o candidato do PSDB, João Doria (atual governador de São Paulo). O filme tem um de seus pontos altos quando Suplicy grava um vídeo agradecendo aos eleitores (quando sua votação chegou à casa dos 275 mil votos) enquanto reconhece a vitória iminente de Doria.

São igualmente reveladoras as cenas registradas na segunda-feira (03/10/2016), o day after da eleição – momento que sabemos ser sempre marcante para candidatos (eleitos ou não), assessores e familiares, quando se dá a famosa “ressaca eleitoral”. Quando o vereador mais votado de São Paulo cede lugar ao homem com características comuns e retoma os hábitos prejudicados durante a campanha – exercícios físicos, aula de piano ou ainda o mero ato de sentar à mesa para a refeição junto aos filhos Supla e João Suplicy, em um primeiro momento, e André Suplicy, mais à frente.

É quando os silêncios ficam mais eloquentes do que os agitados momentos da campanha e da apuração. Tão reveladores quanto o diálogo sobre a pós-campanha travado entre filho e pai, quando João Suplicy comenta sobre o último jogo do Santos, com placar de 2×0, gerando uma das mais reveladoras respostas de Suplicy:
– Agora, vou ter tempo de ir ao jogo do Santos. Se tivesse segundo turno, já estaríamos em campanha.

“The answer, my friend, is blowin’ in the wind
The answer is blowin’ in the wind”
“Blowin´in the wind” – Bob Dylan

 

Mais sobre o filme Quatro Dias com Eduardo

Lançamento oficial: Festival de Cinema do Rio, em 2019.
Direção:Victor Hugo Fiuza
Produção: Glenda Almeida
Elenco: Eduardo Suplicy
Duração: 1h16
Gênero: Documentário
Nacionalidade: Brasil
Sinopse: São Paulo, eleições municipais de 2016. Saímos do Rio de Janeiro com o objetivo de acompanhar o último final de semana de campanha do ex-senador Eduardo Suplicy, então candidato a vereador. Entre agendas políticas e momentos do cotidiano e da vida privada, o filme reflete o Brasil político pós-impeachment, enquanto se aproxima de uma das figuras mais icônicas e midiáticas da política brasileira.

Maiores informações e aquisição de cópia através do messenger: m.me/QuatrodiascomEduardo

 

Bônus: Suplicy recita Rap em sessão no Senado Federal