A Revolução Copernicana do Novo Líder Político

A Revolução Copernicana do Novo Líder Político

 Por Charlles D’Angelus

Dando sequência à nossa reflexão sobre um novo perfil de liderança, trazemos mais elementos para líderes e profissionais que lidam diariamente com eles.

Antes de falarmos sobre o tema de hoje é muito importante abordarmos brevemente alguns conceitos básicos de filosofia.

 

  1. Platão, Kant e Copérnico

Desde Platão (427-347 a.C), muitos pensadores ao debaterem sobre o conhecimento acreditavam que das coisas tinham algo além de suas aparências, além daquilo que se mostrava aos olhos humanos, o que eles denominavam de essência. Para eles, essência das coisas, era uma realidade oculta, secreta e que mostra a verdadeira face daquela algo em análise.

Era essa essência que representaria “a verdade das coisas” e por isso deveria e poderia ser conhecida. Bastava para isso, o filósofo utilizar-se da razão e desenvolver algum método para que pudesse conhecer e experimentar a “essência”, ou seja, “a verdade absoluta” à respeito de cada uma das “coisas do mundo”. Tal visão filosófica fazia com que o ser humano, ficasse girando em torno das coisas, no sentido de tentar encontrar caminhos para conhecer a “essência de cada coisa” e, portanto, sua verdadeira realidade.

Essa compreensão de Platão foi colocada em xeque, muitos séculos depois, por Immanuel Kant (1724-1804), considerado o principal filósofo da era moderna. Kant afirmava, que aquilo que Platão chamava de essência poderia até ser que existisse, mas seria algo metafísico e por isso impossível de apreender simplesmente pelos sentidos. E mais ainda: se não se poderia apreender pelos sentidos não poderia gerar conhecimento, já que o conhecimento, nasce com a experiência.

Em, outras palavras, Kant rebate que não poderíamos nos vincular a “tal da essência” que Platão defendia. Para ele era necessário pensar “na coisa” como ela se mostra, isto é, pela sua aparência. Nesse novo modelo defendido por Kant as coisas passam agora a se mostrar para o homem, não é mais o homem que simplesmente corre atrás das coisas para conhecê-las. O mundo é como as coisas se apresentam verdadeiramente a nós.

Para provocar a mudança de paradigma filosófico, a teoria Immanuel Kant partiu de um referencial anterior, do conhecimento de um importante pensador da área da ciência, o astrônomo e matemático polonês Nicolau Copérnico (1473-1543). Copérnico revolucionou o conhecimento vigente em sua época ao afirmar que não era a Terra que estava no centro do Universo e o Sol girando em torno dela, mas sim, o Sol no centro do Universo e a Terra girando em torno dela. A teoria gerada por Copérnico baseou a inversão filosófica de Kant.

 

2. Inversão filosófica e um novo perfil de líder

Chegamos então no nosso ponto de partida. Você pode estar pensando: o que tem a ver com um modelo novo de liderança política?

Eu diria que simplesmente tudo! É necessário realizarmos uma Revolução Copernicana na liderança política, tal qual a realizada em relação à astrofísica ou à filosofia com Kant.  Uma profunda inversão de paradigma.

Esta necessidade advém de um novo comportamento e postura por parte do eleitorado. Novas expectativas em relação aos líderes, o surgimentos de novos atores políticos, a convivência em uma sociedade da informação e da conexão através das redes sociais e os impactos das mudanças sobre as mídias tradicionais, são elementos que têm a ver com essa transformação. O líder político não tem aparecido como preocupação central, exceto em pesquisas sobre comportamento eleitoral, quando a liderança política ganha visibilidade na pré-campanha e na eleição ou em raras pesquisas acadêmicas realizadas com o objetivo de entender o que define um líder político e o que favorece a projeção na formação dessa liderança. Neste ultimo caso, destaco a pesquisa realizada pala FAPESP “Marketing, Liderança e Comportamento Político em São Paulo (2000-2002)”.

Infelizmente, muitos políticos foram forjados repentinamente e, por necessidade, assumiram o limitado papel de uma personagem. Uma minoria foi obra de uma formação em diversas áreas do conhecimento, em especial nas ciências sociais e políticas.

Isso significa, então, que todos aqueles que assumem mandatos hoje estão errados na sua forma de liderança? Definitivamente não. O que estamos dizendo é que, se é fato que ninguém nasce líder, ao alterarmos os ingredientes da “receita de liderança” vigente é possível ter diversas receitas para “construir” um líder.

Os políticos que se elegeram através de uma liderança fictícia ou valendo-se de uma personagem que visava agradar a partir da roupa ou um tipo de apresentação, podem e devem realizar a sua Revolução Copernicana. Mudar a sua visão e forma de liderança. Cada vez mais a sociedade está mais crítica e cética sobre a política. Esse é um fenômeno que já está acontecendo no meio de nós, mas o que me parece, é que poucos estão conseguindo ler esses movimentos.

Mais do que nunca é preciso unir uma formação de valores com a compreensão das mudanças na sociedade.

 

3. O histórico recente da formação de líderes no Brasil

Fazendo uma rápida memória sobre a história de líderes políticos no Brasil, lembramos que após o regime militar ocorreu um grande vazio político devido às cassações, as prisões, o exílio e até morte de políticos, o que freou e dificultou a emergência do surgimento de políticos novos no país.

Com a reforma partidária em 1979 surgem novas personalidades políticas e com a redemocratização e abertura política na década de 80 emergem, então, outras figuras ligadas a movimentos sociais. Toda a visão estratégica utilizada na formação de um líder político no Brasil advém desses cenários. Visões, que partem de alguns padrões teóricos básicos dados por Maquiavel, Karl Marx e Max Weber, que deram vida a figuras como: “Condottiere”, o líder “Bonapartista” e líderes “carismáticos” e “tradicionais”.

Muito no Brasil se usou a nomenclatura de líder “popular”, termo imputado a muitos políticos e, até hoje, utilizado por alguns de forma errada, ou, para caracterizar pejorativamente um adversário político.

Todas essas nomenclaturas existentes, cada vez menos ajudarão os novos políticos ou aqueles políticos que já construíram sua história. O novo líder político precisará ser forjado em uma visão antropológica que englobe uma verdadeira ciência de virtudes. (ver artigo: Quem será o Novo Líder? Nem Thanos conseguiria prever! )

 

4. O Novo Líder Político e a liberdade

A Revolução Copernicana do Novo Líder Político inicia-se primeiramente porque ele está preocupado com o funcionamento da sociedade democrática e é necessário que ele auxilie a sua organização e a mantenha em funcionamento. Muito mais ainda no momento do pós-COVID-19. Em um tempo de crise de representatividade política, crise das instituições democráticas e desconfiança nos partidos, a Revolução Copernicana não é uma questão de estratégia, mas sim, de sobrevivência do líder e da sociedade.

Percebe-se que não são tanto mais as conexões partidárias, as promessas de investimentos, a forma como se veste, ou a maneira como fala e se expressa um político que está no centro. Antes o eleitorado girava em torno desses aspectos, mas o fundamental hoje é algo muito mais complexo e de difícil leitura. São ideias, sonhos, frustrações, empatia, sentido de vida, valores, resiliência, responsabilidades, essa é a nova órbita em que o líder terá que circundar.

A Revolução Copernicana do Novo Líder Político está intimamente ligada com a diversidade de padrões e de tipologias que até devem servir de reflexão, mas não de alicerces da personalidade.

A liderança na Revolução Copernicana tem a liberdade como meta tanto individual como coletiva. O Novo Líder Político se torna responsável pelo seu destino, decisões e regras, ajudando a construir uma sociedade em que predomine autonomia e não a dependência heteronômica, esta última entendida como o risco do líder deixar de ser o agente percursor e permitir que outros tomem decisões por ele.

O Novo Líder Político Copernicano deve servir à emancipação humana, efeito também encontrado e esperado, por exemplo, no coach, no terapeuta e no analista bem-sucedidos, cujos processos não se encerram quando o cliente finaliza sua a meta, mas que prossegue após, na medida em que o sujeito vem-a-ser sem descansar, pois o inconsciente não acaba, nem os riscos da regressão à heteronomia.

O Novo Líder Político Democrático vive e respira a crença de que:  a liberdade é escolha, emancipação e responsabilidade.

“O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele.” (Immanuel Kant)

“Aquilo que o homem ignora, não existe para ele. Por isso o universo de cada um se resume ao tamanho do seu saber”. (Albert Einstein)

 

(*) Charlles d´Angelus é HEAD e CMO da D´Angelus Business and Life, Coach Político e Especialista em Mobilização e Treinamento. Escreve às quintas-feiras no Eleições Brasil.  [email protected]

 

Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do portal Eleições Brasil, sendo de inteira responsabilidade de seus autores.

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