O futuro das eleições no pós-pandemia

Independentemente do adiamento das eleições, a pandemia deve surtir efeito na campanha eleitoral. No “novo normal”, a tendência é que grandes eventos e o chamado corpo a corpo percam espaço, enquanto a propaganda na internet ganhe ainda mais força. Assim prevê Diogo Rais, consultor jurídico em Direito Eleitoral e Tecnologia, e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Em 2018 tivemos uma campanha extremamente conectada. É um fenômeno que já vinha crescendo e a pandemia fez acelerar ainda mais”, afirma.

Para ele, é difícil imaginar neste ano uma campanha eleitoral nos moldes tradicionais, em meio a uma pandemia que vem obrigando cidades a restringir atividades que estimulem o contato físico. Isso torna ainda mais imperativo o papel da internet, especialmente das redes sociais, para os candidatos.

Algo positivo na avaliação de Rais, principalmente por se tratar de uma eleição municipal. “Mais de 90% dos municípios brasileiros não têm propaganda eleitoral própria na televisão, a população vê os candidatos de outros centros maiores. A internet rompe essa barreira, abrindo um novo canal entre candidatos e eleitores.”

Participe do nosso grupo de Whatsapp clicando aqui.

Por outro lado, Rais reconhece que é preciso cuidado na regulamentação e fiscalização sobre o uso de canais digitais, para evitar problemas como a proliferação de notícias falsas e ataques a adversários. “Temos alguns desafios, visto que a propaganda eleitoral no Brasil tem muitas restrições. Quando se leva isso para a internet, estabelecendo regras em demasia, pode ser mais difícil conseguir bons resultados. Acredito que com uma legislação clara a propaganda eleitoral digital possibilita que a democracia se fortaleça”, observa.”

Tendências para as futuras eleições

Se as próximas eleições já vão representar um salto no uso da tecnologia, o que esperar para as seguintes? Será possível, por exemplo, votar usando o celular? O presidente do TSE já anunciou que pretende conduzir estudos nesse sentido. “Vamos investir tempo e energia em mecanismos de utilização de ferramentas que as pessoas já possuem, como celular, tablet ou computador pessoal. Alguns países do mundo já adotam esse modelo a distância. E nós vamos aprender o que tem sido feito pelo mundo afora e desenvolver nossas próprias tecnologias”, disse Barroso.

Entre os países que já utilizam o voto a distância está a Estônia, no leste europeu. Com 1,2 milhão de habitantes, o país implantou a votação pela internet em 2005 e, nas eleições legislativas do ano passado, 44% dos eleitores usaram esse sistema. Nos Estados Unidos, a primeira votação pelo celular aconteceu em 2018, no estado de West Virginia. Uma pequena parcela da população, principalmente militares em missões fora do país, pôde escolher seus congressistas através de um aplicativo.

“Para Diogo Rais, o Brasil tem condições técnicas para implantar o voto a distância, por meio de celular ou computador. O maior obstáculo, na opinião do jurista, não é tecnológico, mas cultural. “O voto no Brasil é um processo cultural e há uma certa dificuldade em fazer algumas transições. Um exemplo é o voto em branco. Ele tem o mesmo valor do voto nulo, do ponto de vista jurídico não há nenhum sentido em mantê-lo. Mas, por uma questão cultural, optou-se por colocar um botão na urna eletrônica somente para isso”, diz.

Assegurar confiabilidade ao voto a distância é outro desafio que precisa ser superado. Basta lembrar que, mesmo após décadas de uso, a segurança da urna eletrônica ainda é colocada em dúvida a cada eleição. “Em um país onde a compra de votos ainda é uma realidade, manter o sigilo do eleitor também é um desafio muito grande”, acrescenta Rais.

Rafael Morgental, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), acredita que é possível desenvolver soluções no sentido de “transformar o celular em um instrumento de participação política”. Uma delas seria um aplicativo com token (dispositivo eletrônico gerador de senhas) para que a votação fosse feita não em casa, mas em pontos públicos com sinal de wifi. “A tecnologia tem muito a oferecer ao processo eleitoral. Mas temos que fazer movimentos com responsabilidade, pois qualquer mudança simples pode determinar resultados impactantes ou desastrosos. Queremos que a tecnologia seja aliada da democracia.”

Fonte: Gazeta do Povo

 

Print Friendly, PDF & Email